Artigo

IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DE TEMPLOS RELIGIOSOS

IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DE TEMPLOS RELIGIOSOS

 

 

FLÁVIO PORTO DA SILVA[1]

 

 

 

RESUMO

 

Este artigo é dedicado ao estudo da imunidade tributária dos templos religiosos e contemplará, nas Constituições Federais do Brasil, a imunidade tributária decorrente da influência teológica. Na atual Constituição Federal, a imunidade tributária para os templos religiosos é apresentada no artigo 150, VI, ‘b’, como um benefício fiscal aos templos de qualquer culto. O artigo mostrará que o tema em comento, além de recorrente, comporta mais discussão considerando com base nas fontes do Direito, especialmente as doutrinas e jurisprudências. Deste modo, a caracterização do que é templo e culto religioso se faz necessário para entendermos a imunidade tributária. Neste diapasão veremos os tributos devidos e quais estão compreendidos na imunidade tributária não deixando de lado os aspectos controversos quanto a sua aplicabilidade. Considerar o impacto desta imunidade tributária na sociedade também é muito importante visto que a não incidência de certos tributos mostra em cifras o quanto o Estado deixa de arrecadar. O crescimento exponencial das religiões estará ligado então à necessidade de se praticar a fé junto com a garantia constitucional que favorece o funcionamento do templo de forma digna para os praticantes dos cultos nesses locais.

 

Palavras-chave: Imunidade Tributária. Templo. Culto.

 

INTRODUÇÃO

 

Segundo Marcio Pestana[2] o direito é uma ordem concreta, logo se torna o fruto de uma ação humana voltada para a realização dos valores coletivos. O nosso direito positivo torna-se um conjunto de enunciados jurídicos com ênfase no fato concreto, nos valores de certa comunidade, em uma determinada época.

No Brasil, encontramos na Constituição Federal o depósito de valores pelo qual funciona uma cuidadosa delegação de competência. Nesse diapasão é que encontramos, dentre muitos valores da nossa sociedade, a imunidade tributária para resguardar a liberdade de culto nos templos religiosos.

A pesquisa em tela mostrará que a imunidade tributária dos templos religiosos aplica-se aos impostos relacionados às suas atividades essenciais e que se reporta a uma garantia Constitucional na forma de cláusula pétrea.

Como “pano de fundo” histórico sobre a imunidade tributária, Eduardo Sabbag ressalta “[…] de início, que o Brasil é um país majoritariamente católico…”[3], quer dizer, no início da colonização predominava o catolicismo e a igreja exercia grande influência sobre os governantes.

Outrossim, até a proclamação da República o catolicismo era a religião oficial do Brasil e havia total restrição à laicidade, consoante ao artigo 5º da Carta Magna de 1824 que apontava a religião “Catholica Apostólica Romana” como a “Religião do Império”.

Entretanto o fato do Brasil ser na atualidade um Estado laico não significa necessariamente que a sociedade deixou de ser teísta. É sabido que o Brasil é laico e teísta como se verifica no próprio “preâmbulo” da Constituição Federal a menção à “proteção de Deus” sobre os governantes. Mais uma vez assevera Eduardo Sabbag que:

 

Estes partiram da premissa de que um Ser Supremo existe, sem que isso significasse uma reaproximação do Estado com a Igreja, nem mesmo com uma específica religião, porquanto no decorrer de todo o texto fundamental o constituinte “se mantém absolutamente equidistante, seguindo o princípio da neutralidade e garantido o pluralismo religioso”. Não há, portanto, conteúdo sectário na expressão mencionado, constante do “preâmbulo”.[4]

 

Neste diapasão está imbuída a liberdade religiosa, ad argumentandun, a laicidade que é uma forma institucional encontrada nas sociedades democráticas, ou seja, a não relação política que forma a dicotomia Cidadão e Estado. Esta – a laicidade – tornou possível que o cidadão tivesse o direito de escolher por uma crença, mudar de crédulo ou até mesmo não adotar nenhuma religião.

Portanto a liberdade religiosa acolhe a laicidade que também resulta em liberdade de expressão, ou seja, permite a livre manifestação da crença religiosa. Trata-se de uma questão erga omnes, a imunidade tributária dos templos religiosos é subjetiva e assevera a proteção ratione personae da pessoa jurídica na ceara da prática da religião em seus templos, como nas igrejas Católica e Protestante, inclusive, Centros Espíritas, religiões afro-brasileiras, etc., desde que não realizem, segundo Eduardo Sabbag[5], práticas fora do contexto do que se entende como “culto” religioso, como por exemplo, práticas demoníacas e satânicas ou que estimulem a violência, o racismo, os sacrifícios humanos ou o fanatismo devaneador ou visionário.

 

1. EVOLUÇÃO CONSTITUCIONAL DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DOS TEMPLOS.

 

A criação de uma nova ordem social passou a ser uma tendência na seara constitucional e assim vislumbrou-se também a liberdade religiosa, entretanto, para que esta fosse possível, a imunidade tributária era o caminho a ser concretizado, entrementes ao longo da história foi aperfeiçoada nas várias Constituições promulgadas  no Brasil.

A garantia constitucional da imunidade tributária para os templos religiosos adveio de inúmeras influências teológicas no contexto social e político, ou seja, na arte, na cultura, na ciência, na economia, e até mesmo no Preâmbulo da Constituição Federal de 1824 consta um dispositivo que legitima a religião católica, “EM NOME DA SANTISSIMA TRINDADE”, mostrando assim que o poder imperial esteve sob a influência religiosa da Igreja Católica para a legitimação do poder e da coesão social.

Destarte mostrou-se assim que esses valores foram influenciados por tendências religiosas ao longo dos séculos no Brasil, como tentativas de “acertar” na elaboração de uma Constituição Federal que fosse boa para todos, inclusive para aqueles com necessidades espirituais. Deste modo um breve esboço fático da trajetória da imunidade tributária no Brasil faz-se necessário.

Na Constituição de 1824 há o marco inicial da imunidade tributária (de forma indireta) no Brasil conforme aduz o artigo 179, XXXI e XXXII do referido diploma:

 

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.

XXXI. A Constituição tambem garante os soccorros publicos.

XXXII. A Instrucção primaria, e gratuita a todos os Cidadãos.

 

Em breve análise do dispositivo acima, se verificou a preocupação de se estabelecer o socorro público e o ensino primário gratuito sem ônus para tais serviços, o que representaria uma “fumaça”, um esboço para uma redação mais abrangente e específica no futuro acerca da imunidade tributária.

Esta Constituição também modelou o princípio da capacidade contributiva, pois o templo religioso, por representar uma entidade sem fins lucrativos, não suportaria a carga tributária exigida dos outros contribuintes, merecendo tratamento diferenciado. A manifestação da crença no Brasil Imperial foi acolhida no artigo 5º desta Constituição nos seguintes termos:

 

Art. 5. A Religião Catholica Apostolica Romana continuará a ser a Religião do Imperio. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu culto domestico, ou particular em casas para isso destinadas, sem fórma alguma exterior do Templo. (BRASIL, 1824).

 

Entrementes, neste dispositivo percebemos que, embora a religião do Brasil Império fosse a Religião Catholica Apostolica Romana, permitiu-se o exercício de outras religiões desde que realizadas em ambientes privados e reservados, não tendo ainda a forma de templo religioso.

Arremetendo para a Constituição de 1891, se verificou a instituição de competência privativa aos entes da federação para decretar ou isentar impostos, como se aduz do texto constitucional no art. 9º, § 2º da CF/1891:

 

Art 9º – É da competência exclusiva dos Estados decretar impostos:

§ 2º É isenta de impostos, no Estado por onde se exportar, a produção dos outros Estados.

 

Aqui, importante ressaltar, a redação constitucional contém a expressão “isenção”, mas trata-se de imunidade, visto que está retirando do Estado a competência de instituição do tributo em um caso específico, da exportação de produtos de outros Estados.

Com a CF/1891, surgiu também, nos artigos 10 e 11, a imunidade recíproca entre União e Estados-membros bem como a vedação da criação de outros impostos:

 

Art.10 – É proibido aos Estados tributar bens e rendas federais ou serviços a cargo da União, e reciprocamente.

Art.11 – Criar impostos de trânsito pelo território de um Estado, ou na passagem de um para outro, sobre produtos de outros Estados da República ou estrangeiros, e, bem assim, sobre os veículos de terra e água que os transportarem.

 

Os dispositivos citados destacam a importância que o legislador deu para o desenvolvimento econômico do Brasil ao vedar que um Estado-Membro exigisse impostos de outro, pois a carga tributária tenderia a onerar sua produção de bens, serviços, etc., o que propõe, de forma indireta, o que hoje conhecemos como imunidade tributária. Neste contexto, o artigo 72, § 3º da CF/1891, também prestigiou a vedação da incidência de impostos aos cultos religiosos nos seguintes termos: “Todos os indivíduos e confissões religiosas podem exercer pública e livremente o seu culto, associando-se para esse fim e adquirindo bens, observadas as disposições do direito comum.”. Notamos aqui a permissão da CF/1891 para a livre reunião dos cidadãos com animus de realizar cultos religiosos de qualquer crença, fato este que, era defeso na CF/1824, em que só poderia ser realizado culto diverso da então predominante Religião Catholica Apostolica Romana através de reuniões particulares e não por meio de templos religiosos.

Nesse contexto a liberdade de culto se deu principalmente com a chegada dos imigrantes europeus que, com o objetivo de trabalho e moradia substituiu a mão-de-obra escrava.

Na Constituição de 1934 a imunidade tributária, inclusive a imunidade recíproca dos Estados e a imunidade dos templos não é apresentada como nos moldes anteriores; na verdade o que se verificou foi uma previsão embrionária da imunidade tributária que foi consubstanciada na Constituição Federal de 1988, havendo uma ampliação da hipótese de imunidade tributária relacionada a não onerosidade de algumas taxas e serviços, como por exemplo: taxas sobre produtos sobre os quais já havia incidido o imposto de importação; impostos das vendas e consignações em que a primeira operação fosse realizada por pequeno produtor; sobre a exportação de mercadorias; sobre combustíveis produzidos no Brasil; emolumentos e custas aos que precisavam da assistência judiciária; aos profissionais de escritores, jornalistas e professores; instituições de educação particulares de ensino primário, etc.

A Constituição de 1937 preservou imunidade tributária nos moldes anteriores, embora tenha viabilizado a criação de impostos sobre importações e sobre o consumo de qualquer bem, pela União; a instituição de impostos de propriedade territorial não urbana pelos Estados-Membros, etc.

Entrementes a Constituição de 1946 evidenciou a imunidade tributária no tocante ao papel usado à impressão de jornais, periódicos e livros. A imunidade da CF/1946 estava prevista nos seguintes temos:

 

Artigo 31 – À União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios é vedado:

V – lançar impostos sobre:

d) papel destinado exclusivamente à impressão de jornais, periódicos e livros.

 

Como observamos no texto supra, a imunidade se reportaria à matéria-prima, ou seja, ao papel por que a sua destinação seria para a impressão de jornais, livros, periódicos e afins, de modo que esta imunidade, que prevalece até hoje, fomentaria a liberdade de imprensa.

Já na Constituição de 1967 foram mantidas as disposições da Constituição anterior referentes à imunidade tributária, inclusive em relação ao papel para a produção de jornais, periódicos e livros, a fim de proteger os valores que estavam diretamente ligados à liberdade de expressão que também poderia ser de cunho religioso uma vez que quando se trata da produção de livros, estes podem ser destinados à manifestação de qualquer crença.

Por fim, com Constituição de 1988 as imunidades tributárias se consagraram autonomamente no rol das previsões contidas no artigo 150, VI, sendo que, no tocante a imunidade dos templos religiosos, a atual Constituição Federal também representa um retrato da normatização dos direitos fundamentais a livre crença e a reunião com animus de culto, pois de outra forma a sociedade esbarraria no ônus referentes aos impostos para se exercer o direito a crença religiosa. Contrario sensu, a Constituição Federal prestigia, em seu artigo 5º, VI, “[…] a proteção aos locais de culto e suas liturgias”. Dessa forma, numa visão macro podemos entender que o legislador teve a motivação protetiva de resguardar os templos e cultos religiosos, sem prejuízo da garantia prevista no artigo 150, VI, “b”.

 

2. CARACTERIZAÇÃO DE TEMPLO E CULTO RELIGIOSO.

 

Ao delimitarmos a abrangência da imunidade tributária para os templos de qualquer culto é preciso analisar as diversas óticas sobre o que o templo significa na sociedade. Nesse respeito, Eduardo Sabbag[6] informa as teorias pertinentes:

A primeira, Teoria Clássico-restritiva (Concepção de Templo-coisa), aduz que o templo é onde se realiza a celebração do culto e traz à baila que não somente é o lugar onde se pratica o culto como também é o universitas rerum, o conjunto de coisas em que se pretende realizar o culto que pode ser tanto num imóvel como em uma barcaça.

A segunda, Teoria Clássico-liberal (Concepção do Templo-atividade), informa que templo é tudo aquilo que de forma direta ou indireta viabiliza a realização do culto, ou seja, é o universitas juris, o conjunto de relações jurídicas que alcançam os direitos e deveres, como por exemplo, a não incidência de IPTU e/ou IPVA sobre, por exemplo, a casa do religioso e o veículo usado exclusivamente para o trabalho eclesiástico. Nessa teoria é asseverado que se forem utilizados para fins eclesiásticos, quer dizer, relacionados ao templo religioso ou àqueles que praticam serviços sacerdotais, facilitando a realização do culto, não ocorrerá tributação.

E por fim, a terceira, Teoria Moderna (Concepção do Templo-entidade), afirma ser o templo uma entidade institucional, na forma de organização ou associação, apresentando um sentido jurídico mais amplo pelo fato de ser teorizada em base de organização religiosa incluindo todas as manifestações que caracterizam o culto.

Neste contexto, há que se tratar também das seitas para a melhor caracterização de templo e culto religioso. Basicamente uma seita consiste em grupo religioso de menor porte e dissidente em relação às doutrinas e dogmas predominantes, que gira em torno de um líder humano. O Dicionário Online de Português define seita como: “s.f. Doutrina (em geral, religiosa) que constitui crença de grupo dissidente. O conjunto desses dissidentes. Facção, partido.” [7]

Outra definição de seita acrescenta que:

 

A palavra grega (haí·re·sis, da qual deriva a palavra “heresia”) assim traduzida significa “escolha” […] ou “aquilo que é escolhido”, portanto, “um grupo de homens que se separam de outros e seguem seus próprios princípios [seita ou partido]” Greek-English Lexicon of the New Testament [Léxico Grego-Inglês do Novo Testamento], de Thayer, 1889. p. 16. Este termo é aplicado a aderentes de dois ramos destacados do judaísmo, os fariseus e os saduceus. […] Os não-cristãos também chamavam o cristianismo de “seita” ou de “seita dos nazarenos”, possivelmente encarando-o como derivado do judaísmo. [8]

 

Em contraste, nos templos religiosos há a crença do seguidor humano no divino, conforme princípios teológicos materializados formalmente, como se verifica na Torá, na Bíblia, no Alcorão e etc. Há também uma descentralização de incumbências, ou seja, alguns assumem cargos diversos para coordenar, ministrar e auxiliar no funcionamento dos cultos, ainda mais se esta religião estiver presente em outros países.

Em breve incursão conceitual, podemos afirmar que o culto é a manifestação religiosa cuja liturgia ou celebração se adequa aos valores de liberdade religiosa apresentados no texto constitucional. Neste sentido Eduardo Sabbag aduz que…

 

culto deve prestigiar a fé e os valores transcendentais que a circundam, sem colocar em risco a dignidade das pessoas e a igualdade entre elas, além de outros pilares de nosso Estado, com efeito, é imprescindível à seita a obediência aos valores morais e religiosos, no plano litúrgico, conectando-se a ações calçadas em bons costumes (artigos 1º, III; 3º, I e IV; 4º, II e VIII, todos da CF), sob pena do não reconhecimento da qualidade de imune.[9]

 

Dessa forma, considerando o advento da fé pela espiritualidade e a transmissão do seu legado às futuras gerações, ressaltamos o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e as garantias previstas nos incisos VI e VII da Carta Magna aduzem à isonomia e o livre exercício dos cultos religiosos bem como a assistência religiosa em entidades civis e militares. Neste contexto é que o Estado tem o cuidado de aferir sua organização (conforme o artigo 14 do CTN) e a forma de expressão da fé, considerando se a religião ou seita a que se pretende conceder a imunidade tem características “estranhas” ao culto, se estão baseadas, segundo Eduardo Sabbag[10] em rituais demoníacos e satânicos que promovem e pregam condutas totalmente reprováveis como os sacrifícios humanos, a violência, o fanatismo, o racismo, etc.

Ademais o culto representa o exercício da liberdade de crença como corrobora a seguinte definição:

 

Culto é uma religião dita não-ortodoxa ou que enfatiza a devoção de acordo com rituais prescritos. […] Sua adoração é um modo de vida, não uma devoção ritualística. Não seguem um humano nem se isolam do resto da sociedade. Vivem e trabalham no meio de outras pessoas. [11]

 

Por fim, ressaltamos que o culto é uma manifestação abstrata, pois não carece de edificações, podendo ser promovidos em terrenos, inclusive ao ar livre, como nas clareiras e montes, por exemplo, conforme a crença e a vontade daqueles que se reúnem para a cultuação.

3. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA

 

A imunidade é uma exoneração de ordem constitucional no sentido de limitar o poder de tributar, sendo assim, um dispositivo constitucional defeso aos entes federativos à imposição de impostos sobre o patrimônio, a renda e os serviços dos templos de qualquer culto, conforme aduzido no artigo 150, inciso VI, “b” e § 4º, da Carta Magna.

Segundo Anderson Soares Madeira…

 

a palavra imunidade é originária do latim immunitas, que significa dispensa, isenção, liberdade. Tem como base jurídica a manutenção dos valores sociais como a liberdade religiosa e o acesso a informação que são garantidos pela Constituição Federal bem como também fundado nos direitos humanos, ética, moral, que transcendem a pessoa do beneficiado.[12]

 

Ainda sobre a exoneração de impostos, nos apercebemos que a Constituição Federal prevê a não incidência de impostos concernentes às atividades essenciais do templo (artigo 150, VI, § 4º), como um direito e garantia fundamental do sujeito para o exercício da liberdade religiosa, independentemente da extensão da igreja ou do seu número de adeptos.

Na ótica de Luciano Amaro a imunidade tributária se ampara em garantia Constitucional cuja vedação tributária funciona como um freio para que o Estado não incida tributação como a todo contribuinte em regra é devido.[13]

Convém ressaltar ainda a diferença entre imunidade tributária e isenção.

De forma bem simples Sacha Coelho explica que a imunidade é derivada da constituição e a isenção de lei infraconstitucional: “O legislador só pode dizer que dado fato ou aspecto factual não é tributável através da lei (princípio da legalidade). Se usar a lei constitucional trata-se de imunidade, e se utilizar de lei infraconstitucional, cuida de isenção.” [14]

Para o professor Eduardo Sabbag a isenção é uma benesse de liberalidade do ente federativo que tem a legitimidade de assim proceder por meio de lei infraconstitucional que abrangerá o agente especificado na lei.[15]

Em síntese, as imunidades do artigo 150, VI, conforme elucida Ricardo Lobo Torres “[…] protegem certas pessoas e coisas contra a incidência dos impostos, mas não dos tributos contraprestacionais, que não ferem os direitos da liberdade garantidos naquela norma. […]”[16], isso por que os tributos contraprestacionais auxiliam na materialização da infraestrutura dos bairros e cidades, com as taxas e contribuições que não raro são destinadas às melhorias para os cidadãos.

 

3.1. DOS TEMPLOS RELIGIOSOS

 

Etimologicamente a palavra “templo” vem do latim templu que significa o lugar destinado ao culto. Na antiga Roma é que encontramos de forma consagrada o templo, isso por que significava um lugar aberto que também poderia variar na superfície podendo ser em terrenos planos ou em montes onde os sacerdotes prestavam os serviços da sua crença e ofereciam sacrifícios ao divino. Hoje, em sentido amplo, se trata comumente de um prédio ou edificação pública incluindo o terreno destinado ao culto religioso.

No âmbito deste trabalho, convém mencionar que o templo, mesmo carecendo de representação e gerenciamento, tem grande relevância por se tratar de meio para cultuar o divino. Numa visão macro o templo não recebe em si a benesse da imunidade tributária, mas sim a organização religiosa que irá gerir seu funcionamento, mediante a garantia constitucional da imunidade tributária. Todavia são muitas as conclusões do que seria o templo religioso, conforme abordaremos adiante.

Podemos comparar o papel do templo ao de um sindicato, pois em ambas as organizações, nos respectivos locais, se pratica uma atividade específica e certa prestigiando a função social do imóvel. Entretanto, reinteramos que o exercício da crença, do ponto de vista jurídico, não depende do templo para o exercício da fé, pois terreiros, cachoeiras, etc., são utilizadas também como lugar para a prática do culto, assim como na antiga Roma. No passado o templo foi estabelecido para referenciar a prática da liturgia, da crença, onde os fieis congregavam para exprimir sua fé, como exemplo os judeus, que na antiguidade e ainda hoje, se reúnem em sinagogas.

 

 

3.1.1. Dos tributos compreendidos na imunidade tributária

 

É imperioso focar que a imunidade para os templos religiosos representa uma não incidência de imposto, desde que esteja relacionada às suas finalidades essenciais como, a prática do culto, a formação de sacerdotes e ministros religiosos, etc. A propósito, o artigo 150, § 4º da CF representa uma cláusula restritiva da amplitude da imunidade dos templos visando não excluir da tributação atividades não relacionada à finalidade essencial do templo religioso. Ademais, a imunidade tributária não compreende os outros tributos, como, por exemplo, a taxa de iluminação pública, entre outros serviços, a contribuição de melhoria, etc.

Em suma os tributos englobam impostos, taxas, contribuições nas suas variadas espécies e os empréstimos compulsórios, porém, os templos religiosos estão imunes apenas aos impostos relacionados à renda, ao patrimônio e aos seus serviços relacionados às atividades essenciais. Isso se dá pelo fato de que as taxas e contribuições geram contraprestações específicas para a sociedade e também favorecem a infraestrutura e o funcionamento dos templos.

 

3.1.2. Dos aspectos controversos sobre a imunidade tributária

 

O artigo 150, § 4º da Constituição Federal gera uma controvérsia quando condiciona a imunidade tributária de templos religiosos às “finalidades essenciais”. É bem cristalino que os templos religiosos têm por finalidades essenciais o exercício do culto mais o auxílio espiritual e moral dos seus membros, além da instrução de sacerdotes e ministros religiosos, e assim o objetivo de imunizar os templos é garantir a liberdade religiosa expressada em suas diversas formas.

A primeira controvérsia é se a instituição religiosa que obtém receita ofertando artigos temáticos em lojas ou até mesmo em cantinas, tem imunidade quanto ao ICMS. Analogamente a resposta é positiva, conforme as entidades de assistência social citadas na jurisprudência do STF que assevera:

 

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o RE 210.251 – EDv/SP, fixou entendimento segundo o qual as entidades de assistência social são imunes em relação ao ICMS incidente sobre a comercialização de bens por elas produzidos, nos termos do art. 150, VI, c da Constituição. Embargos de divergência conhecidos, mas improvidos.

 

Neste sentido Eduardo Sabbag nos ensina que “[…] há de se estender a imunidade às mercadorias comercializadas pela igreja… desde que se prove tratar-se a atividade conexa de uma ação ocasional, a título precário sem cunho empresarial […]”[17]

Nessa mesma corrente destacamos que as atividades essenciais não podem escapar do manto constitucional da imunidade tributária e dele obterem lucro, haja vista que esse não é o objetivo das organizações religiosas, tampouco concorrer livremente no mercado comercial com empresas do mesmo segmento, como assim leciona Hugo de Brito Machado:

 

A ser assim, as entidades religiosas poderiam também, ao abrigo da imunidade, desenvolver atividades industriais e comerciais quaisquer, a pretexto de angariar meios financeiros para a manutenção do culto, e ao abrigo da imunidade estariam praticando verdadeira concorrência desleal, em detrimento da livre iniciativa e, assim, impondo maus tratos ao art. 170, inciso IV, da Constituição.[18]

 

E ponderando mais além, as atividades de rádio e televisão também serão alcançadas pela imunidade? Considerando que as finalidades essenciais interpretam-se pela garantia de liberdade religiosa através da livre expressão do culto, que se prestará a divulgação, ligadas aos serviços litúrgicos não tendo vinculação com atividades mercantis:

 

Estão, porém, fora do campo de imunidade, sujeitos aos impostos, os serviços prestados desvinculados da finalidade de culto, como os de comunicação radiofônica e televisiva. Toda vez que a atividade das entidades se desvirtuar do fim, significa dizer das “finalidades essenciais”, que é o culto à divindade, afasta-se a imunidade. Assim, na situação em que instituições religiosas adquirem e controlam emissoras de rádio e televisão, utilizados com fins comerciais, ficam fora do campo da imunidade, estando sujeitas aos tributos, em isonomia com as demais empresas do ramo.[19]

                                                                                     

De forma análoga a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região ao decidir sobre a imunidade tributária sob a égide do artigo 150, VI “c” negou por unanimidade a garantia imunizadora quanto a exploração de rádio e televisão ainda que tenha cunho religioso e divulgação doutrinária religiosa:

 

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005670-97.2005.4.03.6119/SP

2005.61.19.005670-7/SP

RELATORA     :              Desembargadora Federal CONSUELO YOSHIDA

APELANTE      :              FUNDACAO JOAO PAULO II

ADVOGADO    :              MARCOS PEREIRA OSAKI e outro

APELADO         :              União Federal (FAZENDA NACIONAL)

ADVOGADO    :              FERNANDLO NETTO BOITEUX E ELYADIR FERREIRA BORGES

EMENTA

 

PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. IMUNIDADE. ART. 150, VI, c , DA CF. ENTIDADE DE CARÁTER FILANTRÓPICO. SERVIÇOS DE RADIODIFUSÃO. PROGRAMAS EDUCATIVOS E CULTURAIS. CONOTAÇÃO RELIGIOSA. ATIVIDADES QUE NÃO CONFEREM À ENTIDADE O CARÁTER EDUCACIONAL OU ASSISTENCIAL.

1. A imunidade discutida é do tipo subjetivo e encontra previsão na Constituição Federal, em seu art. 150, VI, c e § 4º, relativamente aos impostos sobre o patrimônio, renda ou serviços, vinculados às finalidades essenciais das entidades indicadas, competindo à lei a fixação dos requisitos necessários para gozo do referido benefício fiscal.

2. No caso vertente, a impetrante se qualifica como entidade jurídica de direito privado, filantrópica, sem fins lucrativos, que presta serviços de radiodifusão em quaisquer de suas modalidades, em caráter educativo. Pretende, assim, sob a alegação de se enquadrar como entidade assistencial imune, não ser compelida ao recolhimento dos tributos devidos, quando do desembaraço de equipamento destinado à implementação de suas emissoras de televisão.

3. Denota-se que, essencialmente, as atividades desempenhadas pela impetrante baseiam-se na produção e execução de programas educativos e culturais, através de emissoras de rádio e de televisão e de outros meios de comunicação, além de apresentarem nítida conotação religiosa, com a divulgação da doutrina católica e proposta evangelizadora.

4. É bem de se ver que os serviços prestados pela impetrante não se traduzem em atividades típicas do Estado, de relevante interesse público, de sorte que não lhe outorgam a condição de entidade de educação ou de assistência social, tal como previsto na norma imunizante.

5. No caso, não consta dos autos elementos que evidenciem o caráter assistencial da entidade, em especial no que concerne à programação veiculada pela impetrante, através de seus meios de comunicação, para os quais pretende direcionar os equipamentos importados, sem sujeitar-se ao recolhimento dos tributos. Assim, não há como enquadrar a impetrante como entidade de educação ou de assistência social, sem fins lucrativos, para fins de gozo da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, c, da CF.

6. Apelação improvida.

 

ACÓRDÃO

 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 07 de outubro de 2010.

Consuelo Yoshida

Desembargadora Federal

D.E. Publicado em 19/10/2010

 

E quanto ao cemitério, à propriedade alugada a terceiros, a casa ministerial, o veículo e o estacionamento, pertencentes à entidade religiosa? Estarão imunizados? No tocante a correlação com a atividade essencial religiosa, ressaltamos a priori, que o ônus da prova não é do Fisco, mas sim do contribuinte, conforme evidencia Ricardo Alexandre:

 

Ressalta-se, porém, que é do ente imune, e não do fisco, o ônus da prova da relação existente entre o patrimônio, a renda e os serviços e as finalidades essenciais da entidade. Dessa forma, se a entidade não conseguir provar a vinculação, passa a se sujeitar à tributação como os demais contribuintes.[20]

 

No que tange ao cemitério, há uma questão essencial quanto a sua direta vinculação à entidade religiosa e se aquele funciona como extensão desta, mas sem fins lucrativos. Assim sendo poderão ter a garantia imunizadora, mas do contrário, Ricardo Alexandre complementa que “[…] não se aplica a imunidade religiosa aos cemitérios instituídos por particulares com manifesta finalidade lucrativa […]”[21].

Sobre a propriedade alugada a terceiros devemos entender que o legislador teve como motivação imunizar não somente o templo religioso, mas também entidade religiosa latu sensu, desde que a locação também não tenha fim lucrativo e o seu fruto civil seja revertido para a promoção dos interesses do templo religioso. Em jurisprudência do STF verificamos esse entendimento:

 

RE 325.822 / SP – SÃO PAULO

RERCURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator (a): Min. ILMAR GALVÃO

Relator (a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES

Julgamento: 18/12/2002           Órgão Julgador: Tribunal Pleno

EMENTA: Recurso extraordinário. 2. Imunidade tributária de templos de qualquer culto. Vedação de instituição de impostos sobre o patrimônio, renda e serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades. Artigo 150, VI, “b” e § 4º, da Constituição. 3. Instituição religiosa. IPTU sobre imóveis de sua propriedade que se encontram alugados. 4. A imunidade prevista no art. 150, VI, “b”, CF, deve abranger não somente os prédios destinados ao culto, mas, também, o patrimônio, a renda e os serviços “relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas”. 5. O § 4º do dispositivo constitucional serve de vetor interpretativo das alíneas “b” e “c” do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal. Equiparação entre as hipóteses das alíneas referidas. 6. Recurso extraordinário provido.

 

Como notamos a benesse da imunidade patrimonial estão atreladas as finalidades essenciais da entidade. Segundo informa a Teoria Clássico-Liberal (Concepção do Templo-Atividade), tudo que de forma direta ou indireta tem o fim de viabilizar o culto no que tange a casa e o veículo ministerial, será abrangido pela imunidade tributária, conforme indica Eduardo Sabbag:

 

Não deve haver incidência de IPTU sobre a residência do religioso, sobre a casa ou salão paroquial, sobre o centro social, sobre todos os anexos ao templo, como nítidas pertenças do templo [….] não deve haver a incidência de IPVA sobre o veículo (carro, avião, barco) utilizado pelo religioso para a realização do trabalho eclesiástico.[22]

 

No tocante a imunidade tributária do estacionamento, consideramos também o pressuposto da vinculação à atividade essencial e a inexistência do objetivo do lucro para não espancar a livre-concorrência na receita auferida, como ensina Eduardo Sabbag “Se os imóveis são utilizados como estacionamento, com o intuito de auferir recursos para serem utilizados no objeto social dessas entidades. Nesse caso, não remanesce dúvida de que deve subsistir a imunidade.”[23]

Quando se fala em imunidade tributária dos templos religiosos convém mencionar a controvérsia envolvendo a Maçonaria e o acolhimento do princípio da isonomia caso estivesse equiparada ao templo religioso. Para Eduardo Sabbag a Maçonaria é considerada religião e mereceria o direito imunizador[24]. Ademais:

 

A nosso sentir, a maçonaria deve ser considerada uma verdadeira religião, à semelhança de tantas outras que harmonicamente coexistem em nosso Estado laico. Seu rito está inserido em sistema sacramental e, como tal, apresenta-se pelo aspecto externo (a liturgia cerimonial, a doutrina e os símbolos) e pelo aspecto interno (a liturgia espiritual ou mental, acessível com exclusividade ao maçom que tenha evoluído na utilização da imaginação espiritual).[25]

 

Neste diapasão o caso foi tratado, em mais de uma vez, pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que considerou as lojas maçônicas “templos”, para fins de imunidade tributária, afastando-se a incidência do IPTU. Quando se deixa de conceder a imunidade às lojas maçônicas e concede a outro então isso pode parecer uma conduta anti-isonômica.

Quanto ao tema a jurisprudência assevera que:

 

EMENTA 1: TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. RECONHECIMENTO PELO PODER PÚBLICO. MAÇONARIA. ENTIDADE RELIGIOSA. A imunidade tributária para as entidades religiosas, dentre estas as lojas maçônicas, decorre da letra constitucional e dispensa qualquer procedimento administrativo para que exista e produza todos os seus efeitos. Apelo provido. Unânime. (APC 5.176.5999, Relator VALTER XAVIER, 1ª Turma Cível, julgado em 28/06/1999, DJ 09/09/1999 p. 44).

 

Na ementa acima notamos a sinalização para a concessão da imunidade tributária às lojas maçônicas por se equipararem as entidades religiosas.

 

EMENTA 2: EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – IPTU – MAÇONARIA – IMUNIDADE TRIBUTÁRIA – POSSIBILIDADE – INTELIGÊNCIA DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 8º DA LEI COMPLEMENTAR N.º 363/2001. 1. “A maçonaria é uma religião, no sentido estrito do vocábulo, isto é na “harmonização da criatura ao Criador.” É religião maior e universal”. (Proc. 2003.0150093525 – APC, Relator ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA, 5ª Turma Cível, julgado em 15/03/2004, DJ 24/06/2004 p. 64).

 

Já na Ementa 2 destacamos que o reconhecimento da maçonaria como religião foi pautado na promoção da “harmonização da criatura ao Criador”. Neste plano é interessante notar que não é comum uma decisão motivada em argumento doutrinário-religioso, mas sim com base no princípio do livre convencimento do juiz.

No entanto a falta de conhecimento sobre a organização maçônica talvez possa trazer dúvidas quanto ao merecimento da imunidade tributária. Em parte esta dificuldade se justifica pela realização de culto secreto.

Entretanto, para Eduardo Sabbag, há sim características religiosas nos templos maçônicos e assim a Maçonaria faz jus à imunidade tributária por se tratar de uma religião – um tanto reservada – pois não deixa de ser como tal. Isso se da ao fato de que tal organização prega a existência de um Criador em que é formulada sua organização enquanto religião. As suas reuniões são cerimoniais, suas próprias doutrinas não prescindem de símbolos para se explicar a espiritualidade do Maçom que é incentivando a meditação espiritual. O culto do Maçom então é uma prática entendida por seus membros para melhorar as qualidades humanas o caráter do individuo o homem espiritual junto com meditação de todos os valores outrora elencados. Então diante dessas evidências não se poderia dissociar o ritual maçônico do culto[26].

O fato de ser uma reunião secreta ao público em geral não é demérito para se concluir pelo afastamento da imunidade tributária, até porque toda denominação religiosa tem suas regras próprias aos quais os seus membros aceitam ao fazerem parte. Colorário a isso, na história, faraós, sacerdotes e reis tinham reuniões secretas e isso não desmerecia a credibilidade da religião perante o povo. Na Grécia antiga, inclusive ter o conhecimento do “divino” era para poucos.

Em sentido contrário, Madeira[27] entende que a maçonaria não é legitimada como instituição religiosa, pois o acesso dos cidadãos ao culto é uma característica fundamental da religião, assim como a livre propagação da crença, fato este que não ocorre com a maçonaria.

Colorário ao exposto o STF proferiu o seguinte parecer sobre o tema:

 

Processo:           RE 562351 RS

Relator(a):         Min. RICARDO LEWANDOWSKI

Julgamento:      04/09/2012

Órgão Julgador:               Primeira Turma

Publicação:       ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-245 DIVULG 13-12-2012 PUBLIC 14-12-2012

Parte(s):             GRANDE ORIENTE DO RIO GRANDE DO SUL

SALVADOR HORÁCIO VIZZOTTO E OUTRO(A/S)

MILTON DOS SANTOS MARTINS

MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE

FERNANDO VICENZI

 

Ementa: CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. ART. 150, VI, C, DA CARTA FEDERAL. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 279 DO STF. ART. 150, VI, B, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ABRANGÊNCIA DO TERMO “TEMPLOS DE QUALQUER CULTO”. MAÇONARIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO EM PARTE E, NO QUE CONHECIDO, DESPROVIDO. I – O reconhecimento da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, c, da Constituição Federal exige o cumprimento dos requisitos estabelecidos em lei. II – Assim, para se chegar-se à conclusão se o recorrente atende aos requisitos da lei para fazer jus à imunidade prevista neste dispositivo, necessário seria o reexame do conjunto fático-probatório constante dos autos. Incide, na espécie, o teor da Súmula 279 do STF. Precedentes. III – A imunidade tributária conferida pelo art. 150, VI, b, é restrita aos templos de qualquer culto religioso, não se aplicando à maçonaria, em cujas lojas não se professa qualquer religião.

IV – Recurso extraordinário parcialmente conhecido, e desprovido na parte conhecida.

 

Decisão

Decisão: Após o voto do Ministro Ricardo Lewandowski, Relator-Presidente, e dos votos dos Ministros Ayres Britto, Dias Toffoli e da Ministra Cármen Lúcia, que conheciam, em parte, do recurso extraordinário, mas lhe negavam provimento, pediu vista do processo o Ministro Março Aurélio. 1ª Turma, 13.04.2010. Decisão: Por unanimidade, a Turma conheceu, em parte, do recurso extraordinário e, por maioria de votos, negou-lhe provimento, nos termos do voto do Relator, vencido o Senhor Ministro Março Aurélio, que o provia. Não participaram,justificadamente, deste julgamento, o Senhor Ministro Luiz Fux e a Senhora Ministra Rosa Weber. Presidência do Senhor Ministro Dias Toffoli. 1ª Turma, 4.9.2012.

 

A sinalização do STF é negativa ao reconhecimento da Maçonaria como religião por que não está aberta a todos os cidadãos e logo não deve ser alcançada pela imunidade tributária. Afirma ainda que as lojas maçônicas não tem cunho religioso sendo certo que desta forma não há que se falar em atos próprios de uma religião. Isso se dá em virtude da maçonaria não contemplar as características que se convenciona como sendo atividades próprias de uma religião latu sensu, a saber, reuniões cerimoniais onde são ensinadas a seus membros as doutrinas e símbolos ou imagens de santos usados na adoração do divino.

 

3.1.3. Do objetivo e relevância da imunidade tributária para os templos religiosos

 

O objetivo e a relevância desta imunidade estão relacionados ao exercício de qualquer culto, pois de outra banda, as cargas tributárias dificultariam o funcionamento dos templos religiosos. Deste nodo, através da imunidade busca-se estimular a manifestação da liberdade religiosa e sua doutrina.

É interessante observar que a imunidade tem como base também os Direitos Humanos, pois o artigo 5º, XXXIV, ‘a’ e ‘b’; o artigo 149, § 2º, I; e o artigo 195, § 7º da CR/88, asseveram formas do Poder Estatal garantir aos cidadãos os direitos concernentes à liberdade lato sensu, a propriedade e também a liberdade religiosa que está situada entre os direitos e garantias fundamentais. A propósito, na seara da liberdade religiosa (artigo 5º, VI ao VIII, CF), reiteramos que a postura de “neutralidade ou não identificação do Estado com qualquer religião” (artigo 19, I, CF) é o princípio da atual Constituição em que de fato assevera a laicidade do Estado.

Paulo de Barros Carvalho esclarece que o fato da não incidência dos impostos aos templos religiosos é em si uma regra quando diz que “[…] Por outros torneios, significa que a relação jurídica não experimenta alterações em face do cumprimento ou do descumprimento dos deveres nela estabelecidas. […]”[28], ou seja, a Constituição está determinando que com relação aos entes federativos existe uma obrigação de não fazer no sentido de não exigir impostos aos templos religiosos, sob pena de motivar a instauração de procedimentos administrativos para a obtenção da benesse da imunidade tributária. Em outras palavras, o autor assevera que é um direito do contribuinte e um dever do Estado cumprir o dispositivo constitucional criando meios para a sua concretização.

Tendo em vista que a imunidade é um garantia constitucional de não tributação em stricto sensu, também preza pela valorização cultural harmonizando-se com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Portanto, enquanto o artigo 5º, VI, da CF representa um direito fundamental e pétreo, promovendo a prática dos cultos religiosos, o artigo 150, VI, ‘b’ da CF, nos mostra que o legislador teve em mente o favorecimento do exercício dos cultos religiosos.

Ademais, a edificação da imunidade nos pilares socioeconômicos também contribui, ainda que indiretamente, para o desenvolvimento urbanístico, educacional, como por exemplo, a criação de cemitérios, escolas, etc.

É notório que as religiões estão crescendo de forma exponencial no Brasil, e isso em alguns poucos anos como assevera o censo de 2010 do IBGE que confirma esse crescimento:

 

Os evangélicos foram o segmento religioso que mais cresceu no Brasil no período intercensitário. Em 2000, eles representavam 15,4% da população. Em 2010, chegaram a 22,2%, um aumento de cerca de 16 milhões de pessoas (de 26,2 milhões para 42,3 milhões). Em 1991, este percentual era de 9,0% e em 1980, 6,6%.

Já os católicos passaram de 73,6% em 2000 para 64,6% em 2010. Embora o perfil religioso da população brasileira mantenha, em 2010, a histórica maioria católica, esta religião vem perdendo adeptos desde o primeiro Censo, realizado em 1872. Até 1970, a proporção de católicos variou 7,9 pontos percentuais, reduzindo de 99,7%, em 1872, para 91,8%.

Esta redução no percentual de católicos ocorreu em todas as regiões, mantendo-se mais elevada no Nordeste (de 79,9% para 72,2% entre 2000 e 2010) e no Sul (de 77,4% para 70,1%). A maior redução ocorreu no Norte, de 71,3% para 60,6%, ao passo que os evangélicos, nessa região, aumentaram sua representatividade de 19,8% para 28,5%.Entre os estados, o menor percentual de católicos foi encontrado no Rio de Janeiro, 45,8% em 2010. O maior percentual era no Piauí, 85,1%. Em relação aos evangélicos, a maior concentração estava em Rondônia (33,8%), e a menor no Piauí (9,7%).[29]

 

Com o benefício fiscal da imunidade e o incentivo da manifestação religiosa a expansão das religiões é justificada e com isso valores são aprimorados e acrescidos à sociedade moldando posturas e aprimorando o caráter pessoal.

 

CONCLUSÃO

 

Este trabalho buscou mostrar que quando pensamos no crescimento das religiões não se pode deixar de lado o fato de que religião é coisa muito séria sim, inclusive para o Estado, pois concede a quem preenche os requisitos a imunidade tributária, (artigo 150, VI, “b”, CF/88) quais sejam: reuniões cerimoniais, doutrinas, símbolos ou imagens de santos assim considerados por seus fieis, além daquelas elencadas no artigo 14, do CTN.

Neste diapasão foi mostrado que é positivo a CF/88 erigir a imunidade tributária, mas há sim controvérsia e esse tema poderá ser ainda fruto de muita discussão. De fato os cidadãos estão entendendo que podem se reunir para a seu modo adorar o divino praticando o culto em diferentes lugares, prova disso são os inúmeros casos envolvendo a questão da imunidade tributária em diversas situações e, nesse ponto notamos os posicionamentos de doutrinadores e as jurisprudências acerca do tema como foi mostrado no decorrer do trabalho.

Ademais a forma como se pratica o culto é um ponto muito interessante a ser observado a partir do momento quando se leva em consideração a carga sociológica e a cultura que é miscigenada e tem certa parcela de inserção nas religiões existentes no Brasil, mais um motivo pelo qual a pesquisa mostra que a discussão envolvendo esta imunidade tributária poderá ser mais recorrente, pois algumas religiões são usadas para ludibriar o sistema jurídico tributário visando à benesse da imunidade tributária que, a título de exemplo, uma reportagem publicada em 16 de junho de 2013 no Jornal Folha de São Paulo diz que, o Brasil pela estimativa da Receita Federal deixou de arrecadar com as imunidades tributárias 10 Bilhões de reais[30].

Tem-se visto em denúncias do Ministério Público na seara tributária desvio de dinheiro, algo que é totalmente contrário aos valores professados, visto que na verdade os fundos teriam que ser revertidos em favor da organização religiosa e de seus membros.

Contrário sensu as reportagens na seção anexo 1 e 2 mostram as denúncias às práticas de entidades religiosas.

Na reportagem encontrado no anexo 1, o Ministério Publico de São Paulo averiguou que Edir Macedo e os outros indiciados se utilizavam da imunidade garantida pela Constituição Federal para desviarem os dízimos e as doações e promover o enriquecimento ilícito aumentando o patrimônio próprio.

Já na reportagem encontrado no anexo 2, promotores de São Paulo ofereceram denúncia de formação de quadrilha e segundo os investigadores “a atuação da quadrilha não conheceu limites”. Dessa forma pode-se exemplificar em casos concretos o desvio de finalidade que os dízimos e as doações tiveram, qual sejam manutenção de seus templos, ações de caridade e a promoção de interesses espirituais.

Portanto, dessa forma o benefício da imunidade tributária é para ser pesado, medido e achado suficiente e não tratado de forma leviana.

 

INMUNIDAD TRIBUTARIA DE TEMPLOS RELIGIOSOS

 

Este artículo está dedicado al estudio de la inmunidad fiscal de los templos religiosos y he aquí las Constituciones Federales de exención del impuesto sobre el Brasil debido a la influencia teológica evolucionando hacia un principio básico se convierta en la inmunización de garantía constitucional . En la Constitución vigente, la exención fiscal de los templos religiosos aparece en el artículo 150 , VI , ‘b’ , dando así garantías a cualquier templos de culto. En el documento se muestra que el tema en discusión es muy recurrente y todavía tiene espacio para mucha discusión teniendo en cuenta la doctrina constitución y la jurisprudencia. Por lo tanto , la caracterización de los cuales es el culto del templo se convierte en imprescindible para entender la inmunidad tributaria , distinguir el templo , la secta y culto . En este terreno de juego se verán los impuestos adeudados y los impuestos que se incluyen en la inmunidad tributaria dejando de lado las cuestiones controvertidas acerca de cómo y cuando se producen. El impacto de la inmunidad fiscal de los templos religiosos de la sociedad es también muy importante, ya que la incidencia de ciertos impuestos que no se muestran en las figuras como el Estado no formule . El crecimiento exponencial se vincula a la necesidad de practicar la fe con la garantía constitucional que promueve el funcionamiento del templo de una manera digna para los practicantes de estos cultos locales.

 

Palabras clave: Inmunidad tributaria. Templo. Culto.

 

 

REFERÊNCIAS

 

ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 7. ed. São Paulo: Método, 2013.

 

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

 

ASSOCIAÇÃO TORRE DE VIGIA DE BÍBLIA E TRATADOS. Raciocínios à Base das Escrituras. São Paulo, 1985, 1989.

 

CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário Fundamentos Jurídicos da Incidência. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

 

COÊLHO, Sacha Calmon Navano. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

 

Da Agência Estado. Edir Macedo e mais 9 viram réus por lavagem de dinheiro. Disponível em http://g1.globo.com/Noticias/Brasil/0,,MUL1262256-5598,00-EDIR+MACEDO+E+MAIS+VIRAM+REUS+POR+LAVAGEM+DE+DINHEIRO.html. Acesso em 28/03/2014.

 

Do G1, com informações do Jornal Nacional. Denúncia de promotores aponta ‘prática de fraudes’ contra a Universal e fiéis. Disponível em http://g1.globo.com/Noticias/Brasil/0,,MUL1263488-5598,00-DENUNCIA+DE+PROMOTORES+APONTA+PRATICA+DE+FRAUDES+CONTRA+A+UNIVERSAL+E+FIEIS.html. Acesso em 28/03/2014.

 

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010: número de católicos cai e aumenta o de evangélicos, espíritas e sem religião. Disponível em http://censo2010.ibge.gov.br/noticias-censo?busca=1&id=3&idnoticia=2170&view=noticia. Acesso em 30/03/2014.

 

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.

 

MADEIRA, Anderson Soares. Manual de Direito Tributário. 6. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2013.

 

MIOTO, Ricardo. Isenção tributária no Brasil chega a R$ 170 bilhões por ano. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2013/06/1295806-isencao-tributaria-no-brasil-chega-a-r-170-bilhoes-por-ano.shtml. Acesso em 19/04/2014.

 

PESTANA, Márcio. O Princípio da Imunidade Tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

 

SABBAG, Eduardo. A Imunidade Tributária e as Lojas Maçônicas. Disponível em http://atualidadesdodireito.com.br/eduardosabbag/2012/04/26/a-imunidade-religiosa-e-as-lojas-maconicas/. Acesso em 07/03/2014.

 

______. Direito Tributário. São Paulo: Siciliano, 2003.

 

______. Manual de Direito Tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

 

SEITA. Dicionário online de português. Disponível em http://www.dicio.com.br/seita/. Acesso em 02/05/2014.

 

SOCIEDADE TORRE DE VIGIA DE BÍBLIA E TRATADOS. Estudo Perspicaz das Escrituras. São Paulo, 1992, v. 3.

 

TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 18. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2011.

 

ANEXO 1

Edir Macedo e mais 9 viram réus por lavagem de dinheiro

 

O Portal de Notícias da Globo

11/08/09 – 08h13 – Atualizado em 11/08/09 – 08h10

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Edir Macedo e mais 9 viram réus por lavagem de dinheiro[31]

Da Agência Estado

A Justiça de São Paulo acatou ontem a denúncia contra o bispo Edir Macedo e outras nove pessoas ligadas à Igreja Universal do Reino de Deus por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. Segundo o Ministério Público Estadual (MPE), eles são acusados de integrarem um esquema envolvendo empresas de fachada, que remetia ao Exterior dinheiro obtido com doações de fiéis. Esse dinheiro, depositado em paraísos fiscais, voltava ao Brasil em forma de contratos de mútuo utilizados para a aquisição de empresas.

A acusação formal foi oferecida no último dia 5 pelo MPE, por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) – Núcleo São Paulo, e recebida pelo juiz da 9ª Vara Criminal da Capital. Além de Edir Macedo, foram denunciados Alba Maria da Costa, Edilson da Conceição Gonzales, Honorilton Gonçalves da Costa, Jerônimo Alves Ferreira, João Batista Ramos da Silva, João Luís Dutra Leite, Maurício Albuquerque e Silva, Osvaldo Scriorilli e Veríssimo de Jesus.

De acordo com a denúncia, Edir Macedo e os demais acusados há cerca de 10 anos vêm se utilizando da igreja para a prática de fraudes. Durante as investigações, os promotores conseguiram localizar milhares de depósitos em dinheiro em favor da Igreja Universal. Somente no período entre março de 2003 a março de 2008, esses depósitos somaram R$ 3,9 bilhões, de acordo com o MPE.

Levantamento feito pelo MPE e pela Polícia Civil, com base em dados bancários e fiscais obtidos judicialmente, mostra que a Igreja Universal movimenta cerca de R$ 1,4 bilhão por ano no Brasil, dinheiro arrecadado por meio do pagamento de dízimo por seus milhares de fiéis espalhados por 4.500 templos, instalados em 1.500 cidades do País.

 

Dízimo

Na denúncia, o MPE destaca que Edir Macedo e outros bispos destinavam grande parte de sua pregação para a coleta do dízimo, enfatizando a necessidade de a igreja angariar recursos para a compra de óleos santos de Israel, o financiamento de novos templos e o pagamento de pregações nas rádios e TVs. A Universal aceitava cheques, carros e outros bens como doação.

Ainda segundo a denúncia, Edir Macedo e os outros denunciados se aproveitaram da imunidade tributária estabelecida pela Constituição para templos religiosos e passaram a utilizar a Igreja Universal para benefício próprio, captando os valores dos dízimos, ofertas e contribuições dos fiéis, investindo em bens particulares, como imóveis, veículos ou joias. Para os promotores, ficou comprovado que o dinheiro das doações, em vez de ser utilizado para a manutenção dos cultos, era desviado para atender a interesses particulares dos denunciados.

 

ANEXO 2

Denúncia de promotores aponta ‘prática de fraudes’ contra a Universal e fiéis

 

O Portal de Notícias da Globo

11/08/09 – 20h40 – Atualizado em 11/08/09 – 21h09

Denúncia de promotores aponta ‘prática de fraudes’ contra a Universal e fiéis[32]

Justiça abriu processo contra líderes da igreja, a pedido de promotores. 
Dinheiro doado por fiéis teria sido usado na compra de empresas e bens.

Do G1, com informações do Jornal Nacional

O juiz Gláucio de Araújo, da 9ª Vara Criminal de São Paulo, abriu ação criminal contra o fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, Edir Macedo, e mais nove pessoas ligadas a ele, por lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. 
Veja o site do Jornal Nacional

 Segundo a denúncia da Promotoria, Edir Macedo e os outros acusados desviaram dinheiro de doações de fiéis e se aproveitaram da isenção de impostos oferecida a igrejas de qualquer culto, determinada pela Constituição.

  

Diz a denúncia: a atuação da quadrilha não conheceu limites. Seus integrantes se utilizaram da Igreja Universal do Reino de Deus para a prática de fraudes em detrimento da própria igreja e de inúmeros fiéis

Depois de dois anos de investigação, o Ministério Público e a Justiça entenderam que houve desvio de finalidade: em vez de aplicar o dinheiro em obras de caridade e na manutenção de templos, como as igrejas fazem, os recursos das doações foram empregrados na compra de empresas e visavam ao lucro por parte de Edir Macedo. 
O fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, Edir Macedo, e mais nove pessoas, são acusados de se apropriar ilegalmente de dízimos e de ofertas de fiéis e de usar o dinheiro das doações para construir um patrimônio pessoal. 
Diz a denúncia: “A atuação da quadrilha não conheceu limites. Seus integrantes se utilizaram da Igreja Universal do Reino de Deus para a prática de fraudes em detrimento da própria igreja e de inúmeros fiéis”.

A acusação mostrou o exemplo de gente que se sentiu enganada e recorreu à Justiça para ter o dinheiro de volta, como Gilmosa dos Santos, que viu a filha vender utensílios domésticos e até a cama onde dormia para dar dinheiro à igreja, diante da promessa de recompensa em dobro. Maria Moreira de Pinho entregou cerca de R$ 30 mil, em dez anos, acreditando que o dinheiro seria empregado em obras de caridade, o que não aconteceu. 
Igrejas, em geral, independentemente da religião, costumam desenvolver relevante trabalho social – e por isso, estão livres do pagamento de impostos. 

 Mas, segundo a promotoria, ficou comprovado que, no caso da Universal, os denunciados se aproveitaram da imunidade tributária concedida pela Constituição a templos de qualquer culto, para captar dízimos, ofertas e contribuições e fizeram investimentos em bens particulares.

Com base em informações de órgãos federais, os promotores afirmam que a Igreja Universal do Reino de Deus arrecada aproximadamente R$ 1,4 bilhão por ano. Em sete anos – entre 2001 e 2008 – a igreja conseguiu cerca de R$ 8 bilhões. 
Parte desse dinheiro, segundo a promotoria, foi para duas empresas de fachada, a Cremo e a Unimetro Empreendimentos, com sede em São Paulo. Elas estão registradas como empresas de compra e venda de imóveis e, de acordo com a investigação, foram usadas pelos denunciados para esconder a verdadeira origem dos recursos. 
Os promotores descreveram assim a lavagem do dinheiro: “Em vez de aplicar os recursos em obras sociais, o dinheiro, isento de impostos, era desviado para outra finalidade. As doações dos fiéis eram repassadas para a Unimetro e para a Cremo, que, por sua vez, mandavam para duas empresas fora do Brasil – a Investholding e a Cableinvest”. Elas têm sede em paraísos fiscais e, segundo a denúncia, também são controladas pelo grupo acusado. 
O dinheiro voltava ao Brasil na forma de empréstimos a pessoas físicas, ligadas a Edir Macedo. E era então aplicado na compra de aeronaves, imóveis e empresas de comunicação, como emissoras da rede Record. 
Foi com empréstimos da Investholding e da Cableinvest que, de acordo com os promotores, membros da igreja compraram a TV Record do Rio de Janeiro por US$ 20 milhões, em 1992. 
A promotoria apurou ainda que o mesmo esquema de desvio, lavagem e laranjas foi usado em outros negócios, como a compra de um avião. 
Segundo o Ministério Público, o esquema também foi empregado para dissimular a origem do dinheiro na aquisição da TV Record de Itajaí (SC). Um dos acionistas da televisão declarou aos promotores que a compra foi feita com dinheiro de fiéis.

Segundo a denúncia, 32 anos depois da fundação, a igreja está presente em 172 países, tem mais de 4 mil templos no Brasil e 8 milhões de fiéis que seguem quase 10 mil pastores. 
Levantamento da “Folha de S.Paulo”, publicado em dezembro de 2007, mostra que a igreja construiu um império formado por rádios, emissoras de TV, jornais, gráficas. Segundo a reportagem, algumas empresas são do próprio Edir Macedo.

Na denúncia que trata do destino do dinheiro das doações, os promotores afirmam: “A quadrilha era liderada pelo denunciado Edir Macedo, que comandava de fato todas as ações praticadas pela organização”. 
Abaixo dele, estão Honorilton Gonçalves, hoje vice-presidente da TV Record; João Batista Ramos da Silva, integrante da igreja e ex-deputado federal; Jerônimo Alves Ferreira, presidente do grupo Record no Rio Grande do Sul; Alba Maria da Costa, diretora de finanças da Rede Record; e outros diretores e ex-diretores de empresas ligadas ao grupo Universal: Osvaldo Sciorilli, Edilson da Conceição Gonzales, Verissimo de Jesus, João Luis Dutra Leite e Maurício Albuquerque e Silva, todos, denunciados por lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

Na aceitação da denúncia, o juiz da 9ª Vara Criminal de São Paulo, Glaucio de Araujo, diz que, pela investigação inicial, teria havido transferência ilegal de dinheiro arrecadado em cultos religiosos para negócios de interesse dos acusados. 
O juiz deu dez dias de prazo para a manifestação da defesa e mandou indiciar os dez réus. Para o juiz, já existem indícios da participação de cada um deles nos crimes descritos pela promotoria. 
A denúncia, agora aceita pela Justiça, foi ilustrada com um trecho de um discurso de Edir Macedo, divulgado em 1995. No intervalo de uma partida de futebol, em Salvador, ele ensina pastores a se dirigirem aos fiéis. “Você tem que chegar e se impor. Ó pessoal, você vai ajudar agora na obra de Deus. Se você quiser ajudar, amém, se não quiser ajudar, Deus vai me dar outra pessoa pra ajudar. Amém. Entendeu como é? Se quiser, bem, se não quiser, que se dane! Ou dá ou desce! Entendeu como é que é? Então, você nunca pode ter vergonha, não pode ter timidez. Peça, peça, peça e, quem quiser dar dá e quem não quiser não dá. E, se tiver alguém que não dê, vai ter um montão que vai dar.” 
E ele cita um episódio bíblico para reforçar a mensagem: 
– Então, Moisés foi lá, com o cajado dele, com aquele mesmo cajado que ele tinha aberto as águas do Mar Vermelho, visto tantos milagres, ele chegou e perguntou: ‘por acaso pode dessa rocha sair água?’. Ele tocou na rocha assim. Quando ele tocou na rocha, saiu água.

– Por acaso, né?” 

– Por acaso!” 

– Aí, eu pergunto assim: quem é que gostaria de ter o cajado de Moisés? Aí o povo: `eeeuuu!’. Pois você tem, agora é só você usar o seu cajado. 
– Dez mil, traz aqui. 

– Entendeu como é que é? É a fé.

 

Outro lado

O advogado dos réus, Arthur Lavigne, afirmou que já houve inúmeros inquéritos contra Edir Macedo e eles foram arquivados.

 



[1] Artigo científico apresentado ao curso de graduação em Direito da Universidade Iguaçu como exigência final para obtenção do título de bacharel em Direito no primeiro semestre de 2014, sob a orientação do Professor Samir Nassif Roque Fernandes.

[2] PESTANA, Márcio. O Princípio da Imunidade Tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 09.

[3] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 327.

[4] Ibidem, p. 327

[5] Ibidem, p. 331

[6] Ibidem, p. 332, 334

[7] SEITA. Dicionário online de português. Disponível em http://www.dicio.com.br/seita/. Acesso em 02/05/2014.

[8] SOCIEDADE TORRE DE VIGIA DE BÍBLIA E TRATADOS. Estudo Perspicaz das Escrituras. São Paulo, 1992, v. 3, p. 556.

[9] Op. cit., p. 331

[10] Ibidem, p. 331

[11] ASSOCIAÇÃO TORRE DE VIGIA DE BÍBLIA E TRATADOS. Raciocínios à Base das Escrituras. São Paulo, 1985, 1989. p 387

[12] MADEIRA, Anderson Soares. Manual de Direito Tributário. 6 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2013. p. 142.

[13] AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16 ed. São Paulo: Saraiva. 2010. p. 175.

[14] COÊLHO, Sacha Calmon Navano. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 138.

[15] SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito Tributário. São Paulo: Siciliano, 2003. p. 39, 40.

[16] TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 18. ed. Rio de Janeiro: Renovar,  2011. p. 72.

[17] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 340

[18] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31 ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 304.

[19] WEISSHEIMER, Loreno. Imunidade Tributária dos Templos de Qualquer Culto. Monografia apresentada no Curso de Especialização em Direito Tributário pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, nível de Pós-graduação.

[20] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 7 ed. São Paulo: Método, 2013. p. 163.

[21] Ibidem, p. 163

[22] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 332

[23] Ibidem, p. 340, 341

[24]SABBAG, Eduardo. A Imunidade Tributária e as Lojas Maçônicas. Disponível em http://atualidadesdodireito.com.br/eduardosabbag/2012/04/26/a-imunidade-religiosa-e-as-lojas-maconicas/. Acesso em 07/03/2014.

[25] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 345

[26] SABBAG, Eduardo. A Imunidade Tributária e as Lojas Maçônicas. Disponível em http://atualidadesdodireito.com.br/eduardosabbag/2012/04/26/a-imunidade-religiosa-e-as-lojas-maconicas/. Acesso em 07/03/2014.

[27] Op. cit., p. 142

[28] CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário Fundamentos Jurídicos da Incidência. 8. ed.  São Paulo: Saraiva, 2010. p. 200.

[29] IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010: número de católicos cai e aumenta o de evangélicos, espíritas e sem religião. Disponível em http://censo2010.ibge.gov.br/noticias-censo?busca=1&id=3&idnoticia=2170&view=noticia. Acesso em 30/03/2014.

[30] MIOTO, Ricardo. Isenção Tributária no Brasil Chega a R$ 170 Bilhões por Ano. Folha de S. Paulo. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2013/06/1295806-isencao-tributaria-no-brasil-chega-a-r-170-bilhoes-por-ano.shtml. Acesso em 19/04/2014.

[31] DA AGÊNCIA ESTADO. Edir Macedo e mais 9 viram réus por lavagem de dinheiro. Disponível em http://g1.globo.com/Noticias/Brasil/0,,MUL1262256-5598,00-EDIR+MACEDO+E+MAIS+VIRAM+REUS+POR+LAVAGEM+DE+DINHEIRO.html. Acesso em 28/03/2014.

[32] DO G1, COM INFORMAÇÕES DO JORNAL NACIONAL. Denúncia de promotores aponta ‘prática de fraudes’ contra a Universal e fiéis. Disponível em http://g1.globo.com/Noticias/Brasil/0,,MUL1263488-5598,00-DENUNCIA+DE+PROMOTORES+APONTA+PRATICA+DE+FRAUDES+CONTRA+A+UNIVERSAL+E+FIEIS.html. Acesso em 28/03/2014.

 

2 thoughts on “IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DE TEMPLOS RELIGIOSOS

    1. Prezado Marcos, boa tarde.

      Fico feliz em saber que pude contribuir com o artigo científico.

      Minha especialidade na Advocacia é o Direito Tributário.

      Se o Escritório puder ajudar com algo a mais e de alguma forma poderá contar com a Porto Silva Sociedade Individual de Advocacia.

      Atenciosamente,

      Dr. Flavio Porto da Silva
      Advogado | OAB-ES 26036
      Especialista em Direito Tributário (Lato Sensu)

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